quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Construindo uma Adega


Este talvez seja o desejo ou até mesmo sonho de todo amante de vinhos.  Ter uma adega de verdade.
Esta demanda consegue ser parcialmente atendida com as adegas portáteis, havendo no mercado uma variedade considerável de modelos e capacidades.  Porém, para aqueles que já passaram pelo processo de interesse e já estão na paixão desenfreada, que é meu caso, pequenas adegas não dão conta deste também imenso prazer associado ao vinho que é ter mais e mais garrafas. Assim de entusiasta, enófilo surge o colecionador.  Não necessariamente de vinhos caríssimos ou raros, apenas vinhos que te deixam feliz.
Ai então não tem jeito.  Ou você convive com caixas de vinho espalhadas por tudo que é canto, ou toma coragem e constrói uma adega.

Para os abastados não é uma tarefa assim tão difícil.  Contrata-se um arquiteto da moda, desembolsa-se alguns milhares de reais e pronto: tem-se ai seu sonho, sua adega.
Mas para nós simples mortais, talvez passe pela cabeça construir sua própria adega, e então vem as perguntas:  É possível? Quanto custa? E a parte técnica: refrigeração, controle de umidade, iluminação, etc....Madeira, tijolo, ferro, vidro...enfim, como fazer sua própria adega?

Neste post, pretendo mostrar da melhor maneira possível como construí minha própria adega.  Pois é, sonhei com isto e tomei coragem.  Não foi uma tarefa fácil, mas descobri que o prazer de fazê-la aliou-se ao prazer de comprar, guardar e beber vinho.  Foi uma vitória pessoal, uma realização e gostaria então de compartilhar esta experiência e quem sabe incentivar mais pessoas nesta tarefa.

De imediato descobri que há muito pouco coisa disponível sobre o assunto.  Nos EUA e Europa há várias empresas especializadas, muitas mesmo.  Há inclusive kits para que você mesmo monte sua adega.  Aqui no Brasil, há algumas empresas especializadas, porém os preços são bem salgados, quase proibitivos. Como você mesmo fazer, simplesmente não tem quase nada.  O máximo que consegui foram algumas fotos e esquemas gerais de partes de projetos de adegas profissionais.

Vamos então ao passo a passo de como foi a construção de minha adega:

1 - Escolha do local

O lugar ideal é uma caverna enterrada sob vários metros de terra em uma região temperada qualquer  rsrsrsrs.  Mas é claro que tirando alguns privilegiados que realmente moram em locais assim, a escolha deve ser feita levando-se em consideração o espaço disponível e a disponibilidade.  Assim, um quarto de serviço, o quarto que foi um dia dos nossos filhos(que agora são moças e moços vivendo suas vidas), aquela área de serviço cheia de bicicletas velhas e cadeiras de praia enferrujadas, não importa, o fundamental é que seja um local onde haja a possibilidade de ser mantido fechado e com temperatura e umidade controlada.
No meu caso, um quartinho que estava sem uso definido foi a escolha.  

2 - Revestimento

Pensei em várias opções, como pedra, madeira, paredes pintadas, porcelanato, etc...  Acabei optando por um porcelanato que imita tijolos antigos:

Este revestimento não é tão charmoso como pedras, porém é muito mais fácil de ser colocado e garante um excelente isolamento térmico.  Assim eu resolvi vários problemas bem complicados: facilidade da execução, custo baixo e isolamento térmico.
Madeira nas paredes também é uma boa opção, mas no meu caso havia um problema de umidade, já que este quartinho tem duas de suas paredes inseridas em um talude de terra. 





No teto optei por usar lambris de pinus.  Eu já havia decidido pelo pinus como madeira da adega toda, pois ele é barato, leve e fácil de ser trabalhado.

Observar que antes de instalar os lambris, fiz a previsão da instalação elétrica para as luminárias.



2.1 Luminárias


 Eu tinha um problema relativo ao pé direito, muito baixo.  Encontrei umas luminárias que ficaram ótimas.  São pequenas, leves e tem uma iluminação bem interessante para uma adega. Elas se encaixam num espaço bem pequeno e de forma bem simples.  Basta um pequeno furo redondo.















3 - Baias e Prateleiras

Como havia dito optei por fazer as baias e prateleiras em pinus. Comprei tábuas aparelhadas de cerca de 3m por 30cm de largura e 2cm de espessura.  Tenho a facilidade de ter algumas ferramentas elétricas de corte para madeira, o que me permitiu produzir todas as peças eu mesmo, mas isto pode ser resolvido encomendando as peças cortadas em medidas diretamente na serraria.  É bem mais trabalhoso, mas possível. Assim defina as medidas gerais, primeiramente para a estrutura, sarrafos, prateleiras e cantoneiras. Posteriormente encomende as peças menores e os acabamentos.

Veja a foto. Observe que toda a fixação é sempre com parafusos.


As prateleiras que fiz são bem simples e não demandam grandes ajustes.  A estrutura ao fundo são sarrafos oriundos das tábuas mencionadas acima.  Buchas S8 e parafusos permitem uma montagem bem simples e rápida.




 















3.1 Ferramentas

Aqui faço um adendo, pois algumas ferramentas básicas são imprescindíveis:

Furadeira
Serra circular
Pequena bancada
E tudo aquilo que tem a ver com trabalhar com madeira: martelo, pregos, brocas, trena, buchas, parafusos, etc...


Aqui vai uma dica que acho muito importante: use parafusos do tipo philips (fenda em cruz).  E tenha uma pequena parafusadeira a bateria.  Você irá ganhar muito tempo e principalmente não estará ao final do dia com os pulsos inchados. Veja dois exemplos abaixo:




4 - Suportes para as baias

Esta foi certamente a parte da construção da adega que mais deu trabalho.  Gastei um bom tempo estudando desenhos na internet, medindo garrafas, analisando formatos.

Conclui então que o formato mais adequado seria este ai da foto.  Estrutura vazada com suportes fixados com pequenos pregos.






Observar que não fugi das medidas básicas das tábuas que adquiri.  Veja na sequencia abaixo como foram fabricados estes suportes.



Obtendo um sarrafo de 2cm X 1.8cm.  Estas medidas são resultado da espessura da tábua e do mínimo corte que minha serra de bancada faz.  Assim, usando o mesmo critério, caso a opção seja obter as peças cortadas na serraria, converse com o marceneiro.  Uma medida básica assim facilita muito a produção em quantidade.




Veja aqui os sarrafos já cortados.
Não utilizei tábuas inteiras para estes sarrafos.  Utilizei os recortes que foram sobrando conforme ia fazendo a parte estrutural. O mesmo pode ser feito caso a serraria seja a opção.  Depois de construir a estrutura principal, retorne a serraria com os recortes e peça para fazer os sarrafos.



 Nas pesquisas que fiz de como melhor acomodar as garrafas cheguei a uma medida que estabeleci como padrão. Os suportes teriam 26cm de comprimento.  Como podem ver tenho um serra de esquadria elétrica.  Montei um gabarito (batente) e assim fui fabricando dezenas e dezenas de suportes. 




Suportes fabricados








A sequência de fotos abaixo mostra como fiz o acabamento em ângulo na ponta dos suportes. Este acabamento não é fundamental, porém apresenta um aspecto bem bonito.












Foram necessários quase 2000 suportes como este.  A quantidade de suportes será a quantidade de garrafas possíveis de se guardar vezes 2, pois cada garrafa precisa de 2 suportes.

5 - Baias

As baias foram construidas com sarrafos de 4,2cm X 2cm. 4,2cm é a melhor medida para o aproveitamento máximo de uma tábua de 30cm de largura.  Este foi o critério.

Nas pesquisas que já mencionei, cheguei a uma medida que atendesse a maioria dos formatos de garrafas.  9,2cm X 9,2cm.
Fiz dois gabaritos que os usava no momento de fixar os suportes nos sarrafos e depois na hora de fixar as baias na estrutura.
Para calcular a quantidade aproximada de garrafas possíveis num determinado espaço, considere este espaçamento entre garrafas mais a espessura dos sarrafos dos suportes.  Assim uma baia ocuparia aproximadamente 2cm+9,2cm+2cm = 13,2cm.  Assim meça cada lateral/parede do espaço disponível e divida por 13,2.  Tem-se ai quantidade de baias.  A altura disponível irá definir a quantidade de garrafas por baia. Somando tudo o total de garrafas daquela parede ou lateral.
Veja as fotos abaixo:











Cada baia tem suportes tanto de um lado como do outro.
Veja a foto:


6 - Refrigeração e controle de umidade

Este foi um item bastante difícil de se chegar a uma solução.  Consultei dois fornecedores de  condicionadores de ar para ambientes especiais e fiquei bem desapontado.  Muito caro (no minimo R$8.000,00).  E nas especificações não havia nada que me fizesse crer que se tratava de um equipamento realmente especial para adegas.
Resolvi então fazer o simples: adquiri um condicionador de ar tipo split inverter de 9000 btus (o espaço escolhido tem aproximadamente 7m2).  Estes aparelhos tem a vantagem de trabalharem modulando a potência do compressor através da variação da velocidade.  Assim ao invés do liga/desliga de um condicionador tradicional, onde a temperatura varia entre dois pontos próximos, o controle é proporcional. Os fabricantes garantem uma economia de até 40% de energia elétrica.
Minha experiência tem sido bem positiva.  Este condicionador de ar esta se mostrando mais econômico do que as 3 adegas portáteis que possuía.
Estes aparelhos naturalmente retiram o excesso de umidade do ar.  No meu caso este era o problema, pois moro em uma cidade muito úmida.  Em locais onde o ar é muito seco, tem-se que agregar um solução para umidificar o ar.  Alguns potes com água ou um pequeno gotejador em algum canto já resolve.
O ajuste de temperatura que fiz foi para 21°C. Este ajuste esta bem próximo da temperatura considerada ideal para o serviço do tintos.  Estou avaliando ir ajustando este valor para mais perto de 18°C.  Como disse, o consumo de energia, mesmo neste verão que foi especialmente quente, tem sido surpreendentemente baixo.  Mas até então com o atual ajuste estou bem satisfeito.




 E ai esta o resultado final. É uma adega simples, sem nada de especial, mas que é o resultado de um sonho e foi uma dupla realização: tenho uma adega e foi eu que fiz.  Foram vários e vários dias de trabalho duro e cansativo. O resultado muito me alegrou e minha paixão agora tem espaço de sobra.
Ter uma adega assim sugere ostentação e consumismo.
Eu penso que é a realização de um sonho e a possibilidade de ao longo do anos conseguir, mesmo que ao poucos ir desfrutando com muito mais alegria e satisfação desta arte que é o vinho.

Vinho e Vida







7 - Custos aproximados

Revestimento: R$300,00
Mão de obra do Pedreiro: R$450,00
Condicionador de Ar: R$1500,00
Lambris de Pinus (7 m2): R$200,00
Tábuas de Pinus: Cerca de 35 tábuas: R$500,00
Parafusos, buchas, pregos, etc..: R$150,00
Brocas, lixas, etc...: R$100,00


Qualquer dúvida ou esclarecimento, me  escrevam diretamente:
tonani@homail.com
Será sempre muito prazeroso compartilhar informações.